Widgets

Uso de drogas, exposição ao risco e o sistema de recompensas dos adolescentes

sábado, 4 de fevereiro de 2012 0 comentários
A adolescência é um período da vida em que nos expomos muito aos riscos. É provável que haja razões evolutivas para isso. De algum modo, deve ter sido interessante que, em uma fase da vida em que começamos a nos tornar mais fortes e ágeis, nós humanos começássemos a explorar mais o ambiente. É importante ressaltar que milênios atrás os adolescentes deveriam mesmo ser a força motriz da sociedade. A expectativa de vida era muito baixa; o sujeito que entrava em sua quarta década de vida já estava velho. Portanto, foram selecionados os jovens cujo cérebro os beneficiasse com uma maior exposição ao risco e às novidades (em busca de alimento, novas parceiras, lugares mais seguros, etc.). Além disso, os indivíduos com essas funções eram particularmente os do sexo masculino. Ou seja, os homens adolescentes se expõem ao risco de forma diferenciada em relação às mulheres.

Essas características do cérebro adolescente estão presentes ainda hoje, mesmo que as exigências ambientais tenham mudado. Podemos resumir as regiões relacionadas à exposição ao risco em duas: o córtex pré-frontal (responsável, entre tantas outras coisas, por controle inibitório e que amadurecerá ao longo da adolescência) e o estriado ventral (composto pelo núcleo accumbens e tubérculo olfatório, relacionado ao "sistema de recompensas"). Recentemente, duas importantes pesquisas foram publicadas mostrando características particulares do sistema de recompensas em adolescentes. Essas características podem explicar a maior exposição ao risco por parte dos adolescentes, o que teria grande utilidade para entender a consequente maior exposição a drogas pelos jovens. De fato, um comportamento de maior tomada de riscos tem sido associado com vícios, que também estão ligados a anormalidades no processamento de recompensa.

No estudo de Sophia Schneider e colaboradores, 266 adolescentes (55% de meninas) sem história de uso de drogas e 31 adolescentes (48% meninas) com historia de uso de drogas se submeteram a um estudo de ressonância magnética funcional e estrutural. Com a crescente tendência à exposição a riscos (avaliada pelo Cambrigde Gambling Task), o estriado ventral mostrou ativação diminuída bilateralmente durante a atividade de antecipação recompensa  (monetary incentive delay task). A morfometria baseada em voxel mostrou que a maior tendência de assumir riscos foi também associada e parcialmente mediada pela menor densidade de massa cinzenta na mesma estrutura. A ativação diminuída também foi observada quando os participantes com uso de substância foram excluídos. O grupo com uso de substâncias mostrou uma maior tomada de risco, bem como menor ativação estriatal em relação a indivíduos controles. Portanto, os adolescentes com maior exposição a riscos podem procurar estímulos mais fortes para ativarem o seu sistema de recompensa, tornando-os potencialmente susceptíveis a fortes prazeres de curto prazo, como o uso e abuso de substâncias psicotrópicas.

Na outra pesquisa, David A. Sturman e Bita Moghaddam compararam a atividade de unidade única e os potenciais de campo locais no núcleo accumbens e estriado dorsal de 16 ratos adolescentes e 12 ratos adultos durante uma tarefa instrumental de recompensa motivada. Essas regiões estão envolvidas na aprendizagem motivada, processamento de recompensa e seleção de ação. Nos ratos adolescentes, foi observada uma diferença de processamento neural no estriado dorsal, que em adultos é uma região geralmente mais associada com o aprendizado do que com o processamento de recompensa. Essa região esteve muito mais ativa em ratos adolescentes do que em adultos durante as tarefas de antecipação de recompensa. Este estudo demonstra que uma região criticamente envolvida na aprendizagem e formação de hábitos é altamente sensível para recompensas em adolescentes.

Em suma, podemos imaginar que os adolescentes se expõem mais ao risco em virtude de seus sistemas de recompensa necessitarem de maiores estímulos para serem ativados (e quanto maior a necessidade de se expor aos riscos, menos ativo é o sistema de recompensa). Ao se exporem mais ao risco, como ao experimentarem drogas, as áreas críticas para o aprendizado e a formação de hábitos respondem de modo extraordinário. Uma ressalva importante sobre essa questão é que não são apenas as "situações de risco" que são altamente ativadoras do sistema de recompensas. Há uma série de outras atividades, como esportes radicais e jogos eletrônicos, que podem ser altamente recompensadoras e que podem responder à necessidade de busca de sensações dos adolescentes, mas de forma segura e saudável.


Referências:

1- Schneider S, Peters J, Bromberg U, Brassen S, Miedl SF, Banaschewski T, Barker GJ, Conrod P, Flor H, Garavan H, Heinz A, Ittermann B, Lathrop M, Loth E, Mann K, Martinot JL, Nees F, Paus T, Rietschel M, Robbins TW, Smolka MN, Spanagel R, Ströhle A, Struve M, Schumann G, Büchel C. Risk taking and the adolescent reward system: a potential common link to substance abuse. Am J Psychiatry. 2012 Jan;169(1):39-46. [Link]

2- Sturman DA, Moghaddam B. Striatum processes reward differently in adolescents versus adults. PNAS. 2011. [Link]

0 comentários:

 

©Copyright 2011 Psiquiatria Infantil | TNB